quarta-feira, dezembro 31, 2008

Receita de Ano Novo

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)
Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumidas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.

Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, dezembro 30, 2008

Virar de Página

A passos apressados,
Ou languidamente
Devagar…
Aproxima-se…

Não sei se será,
O final,
Ou o principio,
De tudo.

Mas a passos apressados,
Caminho para o final.

Ele aproxima-se,
Silenciosamente,
Mas faz-se anunciar.

E eu,
Todos nós,
O abraçamos,
Como amantes
Em actos de ternura.

Nada se sabe
Dele, se melhor
Ou pior…
Mas tenho esperança
Que dele venha
Algo de mudança.


Porque de tristeza,
Ele nos brindou
Porque sorrisos,
Ele nos deu
e nos roubou.

Que venha!

Traga alegria,
E risos, rasgados
De melhores dias.

Porque este ano, moribundo,
Que se fina,
Eu tenho recordação
De muitas tristezas
E de poucas alegrias.

Dez 2007
Augusto P. Gil

segunda-feira, dezembro 29, 2008

IRREDENTA ESPERANÇA

escondo-me no saco dos brinquedos:
ainda aí guardo esperanças e segredos
fechados a sete chaves.
deles por enquanto nada direi
- quero-os irredentos
puros (sagrados)
como serão os corpos nos noivados
e são as mulheres que eu amei.
escondo-me mas não deserto. Fico
à espreita na tocaia a que me dedico
sempre à espera de novidades.
sei que virá o tempo
de abrir o saco
e sacar lá de dentro outro pacto
com a chuva com o sol e com o vento.

eu sei: virá o tempo. e então direi
quanto esteve sufocado e conservei
com força de medrar e viço
e alma. direi o chão
da aventura
regada pela viva água da ternura
onde por nossas mãos brotará o pão.

eu sei: virá o tempo

Nuno Rebocho
15 Dezembro 2008

domingo, dezembro 28, 2008

No novo ano que aí vem

Recomeça…

Se puderes
Sem angústia
E sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado,
Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças…
Miguel Torga