terça-feira, setembro 20, 2016

Noturno II

Se eu escrever que a noite é bruna,
dirão uns: "Está doido!"; outros: "Que pedantismo!"
Mas não estou doido, não sou pedante, a noite é bruna,
e navego nas suas águas como navegaria
no Bósforo à procura de não sei que peixe ou porto ou flor.

Com a sua, densa, confundo a minha fluida substância
e em ela me transformo para deixar de ser.

Onde os companheiros de viagem? Onde o amplo convés?
 [Onde os canhões? Onde os remos?
          Que viagem me levava para onde?
Tudo esqueci. O farol acabou-se, Constantinopla está de luzes apagadas, todos os mares são o Mar Negro vazio, não há ninguém junto de mim,
e é bruna esta noite velha solta nas águas, nos ares e nos olhos.
Abgar Renault (1901- 1995)

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